quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Maria Alzira Seixo - Informação sobre a Audiência na AR a 25 de Setembro de 2008

Quatro membros da petição «Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa» (Vasco Graça Moura, Jorge Morais Barbosa, António Emiliano e eu própria) foram hoje ouvidos na AR, convocados pela Comissão de Ética, na sequência da entrega desse documento em Maio p.p., na altura com 17.300 assinaturas, com entrega posterior de 33.000 após apresentação ao PR.

Dos 38 deputados convidados para a Audiência – número gentilmente fornecida pelo Senhor Secretário da Comissão, que também presidiu à sessão – compareceu um: a Senhora Deputada Teresa Portugal. Esteve também presente, movida por interesse próprio, a Senhora Deputada Isabel Pires de Lima.

O Primeiro Peticionário, Vasco Graça Moura, enunciou os dados da questão e passou a palavra aos especialistas, os professores universitários de Linguística Jorge Morais Barbosa e António Emiliano, que se exprimiram no sentido publicamente já conhecido em várias das suas intervenções, orais e escritas, em entrevistas, em artigos e em volumes, que tiveram especial cuidado em demonstrações de pormenor que permitissem a leigos o entendimento dos problemas da especialidade. Foram também distribuídas 30 pp de fotocópias com informação diversificada, quer no que respeita a exemplos de incongruências, erros e dificuldades resultantes do que aconteceria com a aplicação do Acordo Ortográfico, quer no que concerne a diferenças existentes, no caso do Inglês, nas diversas zonas do globo em que é falado e escrito. As exposições foram, como vem sendo habitual, convincentes, claras e centradas em exemplos que não deixam margem para dúvidas.

Por meu lado, sublinhei aos Senhores Deputados que o meu desapontamento inicial por encontrar uma sala praticamente vazia (sabendo que a maioria dos membros da AR não dispõe dos conhecimentos necessários em matérias linguísticas para poder votar em consciência) se convertera afinal em satisfação, por estar certa que os deputados que nos representam não votam em matérias que não dominam sem estarem devidamente documentados. Depreendi por conseguinte que as ausências só poderiam ser motivadas pelos esclarecimentos de que os senhores deputados já dispunham desde que, há muitos meses, fizemos entrega na sede deste Órgão de Soberania da ampla documentação existente sobre o Acordo Ortográfico, e nomeadamente da dezena de pareceres profissionais e/ou científicos que, na sua totalidade, o rejeitam.

Efectivamente, se uma questão que diz respeito ao património básico da comunidade, como é a expressão da língua sob a forma escrita (que nos formula identitariamente e nos permite fazermo-nos compreender), é condenada pela unanimidade dos pareceres dos especialistas que sobre ela se pronunciaram, como é o caso com o Acordo Ortográfico, não parece existir alternativa ao que propomos, que é a sua suspensão para posterior revisão.

E não se trata aqui de matéria opinativa, como de modo incauto se pode supor. Não se trata de estar ou não estar de acordo com este documento que projecta a normalização da ortografia. Trata-se de verificar que ele propõe, numa matéria especializada, alterações que não estão cientificamente correctas, e que são unanimemente condenadas pelos entendidos, cabendo por conseguinte aos leigos a tarefa de reflectirem sobre os argumentos técnico-científicos que lhes são expostos. E, no caso de alguma preguiça mental (ou, como tem também acontecido: no caso de concepções idílicas de uma panglossia feliz no vasto universo lusófono – e reparem que se diz ‘lusófono’ e não ‘lusógrafo’, pois as escritas, justamente, também entram no leque das várias outras diferenças de expressão – de muito boa gente que acha positivo que se escreva português em toda a parte da mesma maneira, mas que nunca leu o texto do Acordo Ortográfico, e permite-se defendê-lo sem o conhecer!!!), a solução está logicamente em aceitar a decisão dos especialistas.

Uma vez que vivemos em regime de democracia representativa, que, pelo menos desde a Declaração de Filadélfia, segue os princípios do mérito e da competência (e os mais eruditos pensarão nas teses de Tocqueville sobre a democracia americana), não há que duvidar da seriedade dos nossos representantes políticos na AR. Mesmo que alguns lapsos governativos do passado tenham gerado situações delicadas do presente (como a da aprovação sub-reptícia do Acordo Ortográfico em 1991, ou a da ratificação do Segundo Protocolo Modificativo em Maio passado pela AR e promulgada pelo PR – que não ratificou Acordo nenhum, ratificou apenas uma cláusula da sua aplicação), cabe aos membros da AR, uma vez chamada a sua atenção pela consciência cívica de um grupo de cidadãos, que é o que estamos a fazer desde há seis meses, documentarem-se, votarem segundo as ilações que essa documentação os leva a tirar, e emendarem um erro formidável que, a ser aplicado levianamente, lesaria gravemente o património nacional, com consequências negativas a curto e médio prazo – na identidade, no ensino, na cultura, na economia. E mesmo no plano internacional.

A AR tem, deste modo, a oportunidade de corrigir um lapso governativo monumental. Essa oportunidade é-lhe dada por cerca de cem mil cidadãos, que se manifestam na nossa Petição, de modo gradual e contínuo. E quantas petições com este número de assinaturas entraram até hoje na AR, poderão dizer-nos?

Suspenda-se o AO, reveja-se o AO, e, feito isso, poderemos então contribuir todos para a internacionalização DIGNA (sem subserviências nem amputações) da língua portuguesa, que todos desejamos, e que já está a acontecer – faltando apenas a racionalizada política cultural que lhe dê corpo seguro. Porque é a política que deve servir o país e as suas formas identitárias de expressão e manifestação, como a língua e a cultura – e não o contrário, como só sucede com os governos totalitários!

A população portuguesa, que em grande parte se tornou pessimista quanto à actuação dos seus governantes, saberá compreender a oportunidade e o alcance das atitudes que forem tomadas na AR, e não deixará de se manifestar em conformidade pelos meios ao seu alcance e nas ocasiões que considerar oportunas.

Confiamos, pois, no merecimento, na reflexão e na seriedade dos nossos deputados, e ficamos aguardando o plenário em que de novo a questão do Acordo Ortográfico venha a ser considerada.

Em 25 de Setembro de 2008

Maria Alzira Seixo


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A Petição Contra o Acordo Ortográfico continua aberta e disponível para assinatura. Conta hoje com 95 601 assinaturas.

Assine-a em www.ipetitions.com/petition/manifestolinguaportuguesa.
Enquanto há Língua, há esperança.

Audição Parlamentar da Petição Manifesto Contra o Acordo Ortográfico

Está marcada para as 14h00 de hoje, dia 25 de Setembro de 2008, a Audição Parlamentar da Petição Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa Contra o Acordo Ortográfico, na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República.
Àquela Audição irá uma delegação de peticionários composta pelo primeiro subscritor da Petição, dr. Vasco Graça Moura, acompanhado pelos senhores professores doutores Maria Alzira Seixo, Jorge Morais Barbosa e António Emiliano.

A Petição Contra o Acordo Ortográfico conta já com mais de 94 000 assinaturas e continua aberta e disponível para assinatura, aguardando-se ainda o agendamento da sua apreciação em Plenário da Assembleia da República, nos termos da Lei.

Assine-a em www.ipetitions.com/petition/manifestolinguaportuguesa.
Enquanto há Língua, há esperança.