sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

Mais de 100 000 assinaturas na Petição Contra o Acordo Ortográfico

A Petição Contra Acordo Ortográfico ultrapassou hoje as 100 000 assinaturas e continua disponível para assinatura em www.ipetitions.com/petition/manifestolinguaportuguesa.

A Petição aguarda ainda o agendamento da sua apreciação em plenário da Assembleia da Repúplica, onde foi entregue em 8 de Maio de 2008.

Assine-a! Enquanto há Língua, há esperança.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Quarta-feira de cinzas

Não estão definidas quaisquer metodologias de aplicação do Acordo Ortográfico nas escolas. Ninguém sabe quais as propostas concretas que terão sido elaboradas para se fazer a transição do actual sistema ortográfico para o próximo. Não há, que se saiba, qualquer estudo realizado por serviços competentes do Ministério da Educação. Não há também qualquer estudo sobre as consequências práticas da aplicação do Acordo no que diz respeito ao ensino de português e das doutras disciplinas. E a ministra da Educação nunca abriu a boca em público sobre estas coisas.

A Assembleia da República aprovou um prazo de seis anos para a entrada em vigor do Acordo. É evidente que não pode improvisar-se nesta matéria. Teria de haver especialistas a estudar, a programar e a fasear uma transição. Não consta que tenham sido nomeados. E teria de ser previsto um dispositivo de avaliação cuidadosa e frequente. Não parece que exista.

E, todavia, para as luminárias de dois ministérios, o da Cultura e o da Educação, parece que basta a existência de um corrector ortográfico da Priberam para o Acordo Ortográfico começar a ser aplicado no ensino! Não em seis anos, mas em menos de seis meses! Com este Governo é assim: faz-se tudo sobre o joelho e o princípio é sempre o mesmo: "Zás! Meia bola e força!"

Sem que tenha sido aberto concurso, aparece uma empresa privada a fornecer ao Estado uma ferramenta informática, ferramenta essa que igualmente não foi ainda nem está para ser, que se saiba, examinada e testada por especialistas.

Diz o ministro da Cultura que ela está a ser testada na Imprensa Nacional-Casa da Moeda. Fui administrador da IN-CM durante perto de dez anos e nunca me constou que ela fosse um serviço de análise pedagógica ou didáctica dependente do Ministério da Educação.

Diz também o ministro que, com a ferramenta informática FLIP 7, quem escrever em português terá a opção de converter automaticamente o texto segundo o novo Acordo Ortográfico, sejam as normas do Brasil sejam as de Portugal.

O grau de paranóia que nesta matéria atingiu o Governo não lhe permite atentar nesta realidade comezinha: não há conversor que permita escolher entre as várias versões gráficas tornadas facultativas pelo Acordo e portanto todas e qualquer uma delas são susceptíveis de ser utilizadas, pelo facto singelo de todas e qualquer delas constituírem alternativas admitidas como correctas!!! Ter-se-á previsto um sistema aleatório "convertendo" as grafias sem qualquer espécie de critério que não seja o das leis do caos? Ou o conversor imporá inexoravelmente a adopção de uma grafia única nos casos em que o Acordo consagra a facultatividade?

Como escreve António Emiliano, "haverá apenas uma 'norma multiforme', que terá a particularidade de, para além de não ter instrumentos normativos conexos, permitir que se escreva um sem-número de palavras de maneiras distintas sem regra. A palavra que hoje em Portugal se escreve oficial e correctamente 'decepcionámos' passará a escrever-se oficial e correctamente em todos os países lusófonos signatários 'decepcionámos', 'dececionámos', 'decepcionamos' e 'dececionamos'. Presume-se que o 'conversor' apresentará todas as possibilidades, o que tornará o procedimento rotineiro de correcção ortográfica um pesadelo para qualquer usuário".

O mesmo professor tem chamado continuamente a atenção para o facto de o Acordo gerar, "para além do elevado número de grafias duplas, formas com quatro grafias distintas e um conjunto incontável de expressões compostas com oito, 16 e até 32 grafias possíveis, sem oferecer qualquer critério normativo", facto que, acrescenta, "põe em causa a estabilidade das terminologias técnico-científicas", essencial para o desenvolvimento.

Mas então como é que a lição, o manual, o livro de leitura, o auxiliar de estudo vão escolher uma das grafias possíveis? E como é que se vai explicar a docentes e a discentes a razão por que não se opta por qualquer das outras?

Com a TLEBS e com o português de uns ofícios recentes de uma dama que é directora regional de educação do Norte, o Carnaval já tinha chegado à língua portuguesa. Mas é verdadeiramente deprimente a ressaca ortográfica que se vislumbra nesta Quarta-Feira de Cinzas.

Vasco Graça Moura | Escritor | in Diário de Notícias | 25/02/2009


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A Petição Contra o Acordo Ortográfico continua aberta e disponível para assinatura.

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quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

O CANGALHEIRO?

Alguns políticos garantem a tomada de medidas ditas eficazes contra a crise e fingem-se convencidos da chegada próxima de melhores dias. Mas não conseguem afastar um pressentimento de iminência de bancarrota geral e cessação de pagamentos nos seus países, nem a perspectiva de aumento violentíssimo da carga fiscal e de redução de salários na casa dos 20% ou 30% ou, em alternativa, de saída do euro e subida vertiginosa das taxas de juro e do custo de vida, o que viria mais ou menos a dar ao mesmo.

Mas apesar desses tratamentos de choque e de muitos apelos à solidariedade de permeio, nenhum político poderá garantir que as coisas vão melhorar nos próximos anos. Pelo contrário. O catálogo de situações e de países em estado crítico não cessa de engrossar, com a Islândia, a Irlanda, a Letónia e a Grécia à cabeça para já. Chegará a vez da Espanha e só por milagre é que, um dia destes, Portugal não entrará na lista.

Ninguém sabe onde é que tudo isto vai parar. Só pode prever-se que as falências, a degradação do tecido produtivo, o desemprego, a pobreza, a conflitualidade social, o crime, a impotência das autoridades, a insegurança de pessoas e bens, não pararão de crescer e também que, entretanto, se acentuarão fenómenos inquietantes como o proteccionismo e a xenofobia, ao arrepio das declarações políticas. Nestas bolandas em que ninguém confia em ninguém e só a Alemanha parece confiar em si mesma, a União Europeia pode esboroar-se enquanto o diabo esfrega um olho.

Em Portugal, o estado patológico é muito anterior ao eclodir da crise. Silva Peneda acaba de demonstrar, em artigo publicado no JN, que 14 dos 15 principais indicadores económicos e financeiros regrediram entre 2004 e 2009, sendo que a evolução positiva do défice público foi conseguida por aumento da carga fiscal e não por redução da despesa do Estado. E agora vai ser grande a cambalhota quanto ao défice.

Esse tem sido o desvelado contributo do Governo socialista para o progresso e o de-senvolvimento nacionais. Isto é, também não andaremos muito longe da bancarrota, de que talvez nos livre a pertença ao Eurogrupo, embora nada nos livre de um prolongado período das mais negras privações.

É neste quadro negativo de um país que vai a pique, completamente desarmado para fazer face à crise por obra e graça das sucessivas batotas do seu Governo, que o ministro da Cultura vem falar na aplicação efectiva do Acordo Ortográfico, o mais tardar em 1 de Janeiro de 2010, ou mesmo antes.

Não nos detenhamos hoje nas enormidades e aberrações intrínsecas da peça. Em Março de 2008, o Governo previa um prazo de seis anos para tal aplicação (art.º 2.º da Proposta de Resolução 71/X/3) após o depósito do instrumento de ratificação do segundo protocolo modificativo!... Passemos. Não curemos sequer da inexistência do vocabulário ortográfico comum, prevista desde a primeira versão do Acordo como devendo anteceder a sua entrada em vigor.

No tsunami mundial, uma das principais, se não a principal, janelas de oportunidade que restam a um país falido em todos os azimutes como o nosso é a intensificação das relações de cooperação, de investimento, de negócios e de parcerias empresariais com as Repúblicas Populares de Angola e de Moçambique, muito em especial com a primeira.

Nem Angola nem Moçambique ratificaram o Acordo Ortográfico. Ele não se aplica nesses países. Mas é este o momento que o ministro da Cultura escolhe para promover uma aplicação que só vai acarretar as maiores confusões e dificuldades de entendimento e comunicação aos empresários portugueses, aos seus congéneres africanos (note-se: a todos, e não apenas aos editores), bem como às autoridades políticas e administrativas, às escolas e aos cidadãos em geral dos países em questão!

Já era um puro dislate falar-se, como o ministro faz, em evitar a "fragmentação" da língua. Mas ao impor-se essa fragmentação, ao querer-se oficializar a toda a pressa o fosso entre as grafias de Portugal, de Angola e de Moçambique, o dislate transforma-se em perversão e a perversão em encravamento deliberado de um futuro possível.

Porque há-de o ministro da Cultura candidatar-se a gato-pingado do nosso lindo enterro e a cangalheiro oficial da língua portuguesa?


Vasco Graça Moura | Escritor | in Diário de Notícias | 11/02/2009


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